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quarta-feira, 24 de junho de 2020

"I Am Mother" e a atração das velhas crenças


Lançado recentemente, o filme I Am Mother (Netflix, 2019) é ambientado em um futuro apocalíptico, dentro de uma instalação onde uma jovem é criada desde seu nascimento por um robô, a quem chama de Mãe. Tudo o que essa jovem sabe sobre o mundo e sobre si mesma veio dos ensinamentos da Mãe. Os acontecimentos durante o filme vão fazendo a jovem questionar muitas verdades, ocasionando ora a total confiança, ora a total desconfiança na Mãe. E paramos por aqui para não dar mais spoiler!
Bastante significativo é o fato dessa jovem não ter nome, é apenas chamada de “Filha”, o que simboliza sua dependência das decisões da Mãe, que sempre a convence de como agir e em que acreditar. Trazendo o enredo para a construção de crenças, o filme demonstra muito bem a forma com que nossos esquemas cognitivos são construídos desde nossa mais tenra infância (há quem diga que desde a vida intrauterina, ou mesmo antes). Esquemas esses que formam nossos pilares de sustentação para a tomada de decisões e o avanço pela vida.
Por serem nossos pilares, não podemos viver sem crenças. Por mais que possam nos limitar, nossas crenças tem um álibi poderoso: elas nos trouxeram vivos até esse exato momento, seja do jeito que for. Sempre que questionadas, nossas crenças apontam para o exterior, buscando provas concretas de que estão sempre certas, e que seu questionamento representa risco para nossa própria existência. O conflito começa a ocorrer em momentos em que tais crenças, que podem já ter sido importantes, deixam de fazer sentido e começam a limitar nossa evolução e nosso alcance de objetivos. Por menos sentido que possam fazer, elas se manterão ali, firmes, como nossos mentores, dando a palavra final em cada uma de nossas decisões. Por experiência própria, tenho percebido que conseguimos conscientemente aperfeiçoar o funcionamento de algumas crenças por dois ou três anos. Porém, elas seguirão apontando para o exterior, buscando fatos que comprovem que elas estão certas. Assim, a crença funciona como um grande ímã: conseguimos nos afastar por um tempo mas, sem esforço para avançar, acabamos sendo atraídos de volta.
Descontruir voluntariamente uma crença que nos limita (e que muitas vezes nem sabemos) é trabalho possível e que, inevitavelmente, requer dedicação, e requer principalmente que coloquemos em prática novas ações e atitudes pois, com já mencionado, as crenças se fortalecem daquilo que enxergam do exterior. Quer dizer, requer esforço se decidirmos que queremos mais da vida, pois pode ocorrer de nossos pilares virem abaixo em um único instante, como quando em extrema necessidade ou desespero. Então, apesar de adquirirmos crenças novas sem esforço, a dor será muito maior.
Como no filme, o abalo de nossos pilares, seja por vontade ou por aflição, não é um momento indolor mas, certamente, trabalhar voluntariamente naquilo que nos limita é bem menos dolorido. Foi sofisticando esquemas cognitivos para que trouxessem mais benefícios e sendo resiliente para suportar a queda e reconstrução de alguns de seus pilares mais fortes que a Filha passou pelo filme.
Que sejamos menos Filhos ou Filhas de nosso passado, e mais Pais ou Mães de nosso futuro.
Grato pela confiança,
Marcelo Pelissioli
 
 

terça-feira, 2 de junho de 2020

Sonhos durante a pandemia


“Estou nesse avião novamente, ansioso para a decolagem e para as longas horas que ficarei aqui sentado e tenso, até chegar à França. Alguns passageiros vêm se encaminhando para seus assentos, colocando seus pertences no bagageiro, outros já estão sentados. De repente, o movimento dentro do avião cessa, e a aeronave lentamente começa a se movimentar. Nesse momento, uma chuva torrencial cai, e o avião muda sua rota de decolagem. Pela janela, vejo que ele está à beira de um altíssimo morro de terra vermelha, e entendo que ele precisa descer esse morro para conseguir ganhar impulso para a decolagem. Sinto o corpo todo enrijecido pela tensão, perguntando-me se, naquele temporal, conseguiremos mesmo chegar à França”.

Este foi o sonho que tive na madrugada de 02 de junho de 2020. É a terceira vez nos últimos dias que sonho com aviões e França. A maior curiosidade aqui não é o sonho recorrente, mas é eu pessoalmente lembrar de meus sonhos, coisa que dificilmente consigo.

A ciência já comprova que os sonhos são um dos mecanismos usados pelo cérebro para a regulação emocional e formação de memórias de longo prazo, valendo-se em grande parte de metáforas de cunho inconsciente e pessoal. Assim, duas pessoas que sonham com a mesma coisa podem ter razões distintas para tal.

Sabendo disso, saio à pesquisa de alguma relação entre o momento da pandemia e a alteração da capacidade de recordação e recorrência de sonhos, e descubro que sim, há estudos sobre o que vem sendo chamado de pandemic dreams, ou sonhos da pandemia.  A mudança de rotinas, de locais frequentados, a incerteza dos eventos futuros e o stress causado por todo isso têm elevado em 35% a ocorrência de sonhos repetidos e rememorados por pessoas que não costumam lembrar de seus sonhos. Saliente-se que esse é um mecanismo natural do corpo e de nossa psique, que indica que mais pessoas têm tido sonhos mais vívidos, detalhados e marcantes, além de terem acordado mais vezes durante seus sonhos, o que colabora com a sua manutenção na memória.

Como o vírus é obviamente invisível, cada pessoa tem dado a ele uma significação em seus sonhos, que está longe de poder ser interpretada por livros popularescos. O que fica como a maior interpretação desses sonhos é a demonstração de como andam nossas emoções em nossos porões psicológicos e, com essa análise e entendimento, criar planos de ação para a manutenção de nossa saúde física, com a atenção e proteção que o momento exige, e também de nossa saúde mental, na medida em que ambas são pilares de nossa qualidade de vida e propulsores para nossos objetivos.

Assim, nossos sonhos podem ser boas demonstrações de nosso momento atual, e nos dar pistas de como seguir adiante, equalizando a velocidade, profundidade e o impacto de nossas ações.

O Coaching preconiza o movimento embasado nas condições que cada pessoa tem de se movimentar, ampliando sua perspectiva à medida que o caminho possa ser construído. Que bom que me surgiu esse estudo para entender melhor esse meu momento e de meus sonhos. Pesquisa, aliás, realizada pelo Centro de Pesquisas de Neurociência de Lyon.

Lyon, na França.

Grato pela confiança,
Marcelo Pelissioli